Uma das polémicas levantadas pelo acordo ortográfico 1990 é a relação entre o que se diz e o que se escreve e a proximidade entre letras e sons. Contrassensos (e são muitos!) como o escrever do mesmo modo o verbo colher e o substantivo colher podem causar dificuldades na aprendizagem da língua. Espero que esta tarefa de listar alguns erros comuns da língua portuguesa possa ajudar a saber como se diz ou escreve… ou resolver algumas dúvidas.
A lista que se segue estará em contínua ampliação, ao ritmo a que eu encontrar novos (e não é difícil), nos jornais, nos programas de televisão, nos locais de encontro… Volte sempre!, como dizem os outros, para saber de novidades.
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Como se diz ou escreve…
- Aselha — e não, azelha: “o jogador que o treinador convocou é um aselha”
- …o direito que LHES ASSISTE — e não, …o direito que os assiste: “O antijogo que o Tondela fez é um direito que lhe assiste”. Aqui, assistir significa ser seu por direito. Ver assistir, quando este verbo significa dar assistência.
- O advogado que O ASSISTE… — e não, o advogado que lhe assiste… : “…a relação entre o paciente e o médico que o assiste”. Aqui, o verbo significa dar assistência. Ver assistir, no sentido de ser seu por direito.
- Não caibo nesta cadeira — e não, não cabo nesta cadeira. É o presente do indicativo, conjugado assim: caibo, cabes, cabe, cabemos, cabeis, cabem (no presente do conjuntivo: caiba, caibas, caiba, caibamos, caibais, caibam).
- Caem — e não, caiem: “Caem nesse erro com muita facilidade”.
- Chazinho — e não, cházinho nem chàzinho. Em 1971, foi abolido o acento circunflexo e o grave com que se assinala a sílaba subtónica dos vocábulos derivados em que figuram os sufixos –mente ou os iniciados por -z. Como pezinho.
- Com certeza — e não, concerteza: “Com certeza esqueceram-se de telefonar”
- COSTELETA — e não, costoleta: “Costeleta é a costela de certos animais”.
- DEVE SER — e não, deve de ser: “Deve ser hoje que chove”.
- DIMINUTIVO — e não diminuitivo (tal como constitutivo, distributivo ou restitutivo): “colherzinha é um diminutivo de colher“.
- EMINENTE — e não iminente, se quiser dizer elevado e (no sentido figurado) importante, excelente: “uma torre eminente”; “sua Eminência”. Iminente, se quiser dizer prestes a acontecer: “risco de queda iminente desta árvore”.
- A ÊNFASE — e não, o ênfase: “alguns escritores usam a ênfase para agradar aos leitores”.
- UMA ENTORSE — e não, um entorse. Embora segundo alguns dicionários o substantivo seja masculino, o feminino é predominante: “a maioria das lesões de menisco no desporto é causada por uma entorse do joelho”.
- ENTRETEVE-SE (como o verbo ter: entretive-me, entretiveram-se) — e não, entreteu-se. Tal como absteve-se, manteve-se…: “alguns partidos entretiveram-se a explorar a notícia”.
- FÃ (plural, fãs) — e não fan: “sou fã dessa banda”
- DUZENTOS GRAMAS — e não, duzentas gramas, se significar peso: “comprei duzentos gramas de fiambre”. A grama é aquela relva que se vê nos jardins.
- EU GOSTO/acho que/… — e não, eu, pessoalmente/particularmente, gosto…: “Eu gosto bastante da língua italiana”.
nb: …a menos que haja alguma intenção no uso do pleonasmo. Por exemplo, para enfatizar o caráter pessoal do que se segue a “gosto/acho…”: “eu já felicitei, pessoalmente, o meu adversário pela sua vitória”
- IMBRÓGLIO — e não, embróglio: “O BE acusou o Governo de criar um ‘imbróglio jurídico’ com a sua proposta de casamento entre pessoas do mesmo sexo”.
- IMINENTE — e não eminente, se quiser dizer prestes a acontecer: “risco de queda iminente desta árvore”. Eminente , se quiser dizer elevado e (no sentido figurado) importante, excelente: “uma torre eminente”; “sua Eminência”.
- INDEMNIZAR (e indemnização) — e não, indeminizar: “o governo aprovou indemnizações aos lesados do BES”.
- Um ITEM, dois ITENS — e não, dois ITEMS (como um jovem > dois jovens): “Os itens variam entre relógios de marcas de luxo a garrafas de Whisky de 20 a 30 anos”
- LOSANGOS — e não, losângulos: ” o losango é um quadrilátero”.
- MAL ESTAR (plural: mal-estares) — e não, mau-estar: No mal-estar em que vivo / No mal pensar em que sinto… (Fernando Pessoa). Mal é substantivo (o mal) ou advérbio (fica mal, bastante mal). Mau é substantivo (o mau da fita) ou adjectivo (mau filho, mau negócio).
- MENU (como canguru)– e não, menú: “Encontre aqui menus, preços e horário de funcionamento”
- LEVANTAR O MORAL (moral, no sentido de estado de espírito, ânimo) — e não, levantar a moral: (a moral é um domínio filosófico): “…é uma maneira de levantar o moral das tropas”.
- OBRIGADO (se o falante for do sexo masculino); OBRIGADA (se o falante for do sexo feminino); OBRIGADOS (se for um grupo de falante do sexo masculino ou feminino e masculino); OBRIGADAS (se for um grupo de falantes do sexo feminino).No norte de Portugal, é (cada vez menos) comum dizer bem haja, em substituição de obrigado(a).
- OUTREM (como nuvem, ontem) — e não, outrém: “Se recordo quem fui, outrem me vejo…” (Fernando Pessoa)
- PARALELEPÍPEDO — e não paralalipípedo: “paralelepípedo é um poliedro com seis faces paralelas e iguais duas a duas, todas paralelogramos”.
- PEDIR QUE… — e não pedir para…: “António Costa pediu aos seus colegas de partido que tivessem contenção” e não, como na altura se escreveu nalguns jornais. Pede-se para fazer alguma coisa, quando é o próprio que quer fazer essa coisa: “Marcelo pediu para sair para a Juventus”
- PEJORATIVO — e não, perjorativo: “quando começou a ser usada, a palavra barroco tinha um sentido pejorativo”.
- PERU (como cru) — e não, perú: “o peru é uma ave galinácea”.
- PUDESSE(M) — e não, podessem: “Se eu te pudesse dizer / O que nunca te direi, / Tu terias que entender /Aquilo que nem eu sei.”
- QUADRUPLICAR (“multiplicar por quatro”) — e não, quadriplicar: “as receitas do banco quadruplicaram, no último ano”.
- RUBRICA (com a acentuação tónica na penúltima sílaba, /rubrica/) — e não, rúbrica. “O Poema Ensina a Cair é uma nova rubrica do Expresso“.
- A SIDA (de (a) síndrome da imunodeficiência adquirida) — e não o sida: “a sida é uma doença crónica com tratamento” (o termo já foi substantivado na língua portuguesa; portanto, escreve-se com minúscula: a sida)
- A SÍNDROME — forma preferível a a síndroma e preferível também a (menos comum) o síndromo: “as síndromes são consideradas um tipo de mistério da medicina”.
- ENVIAR UMA SMS — e não, enviar um SMS, se nos referirmos à mensagem recebida/enviada; mas UM SMS, se nos referirmos ao sistema de envio: “enviei uma SMS pelo SMS” (SMS é a sigla do inglês Short Message Service, serviço de mensagens curtas; o que enviamos ou recebemos é uma mensagem; para isso, utilizamos um sistema).
- UMA T.A.C. (uma Tomografia Axial Computorizada) — e não, um T.A.C. : “Como se faz uma T.A.C. (passo a passo)“ (nb: aceita-se um T.A.C., quando se faz referência a um exame complementar de diagnóstico que é a T.A.C.).
- TRILOGIA — e não, triologia (como já se ouviu a deputado): “Uma trilogia não é ‘uma obra com três volumes’, mas, sim, um ‘conjunto de três obras do mesmo autor'”; “Foi a adaptação a uma série televisiva da sua trilogia Os Prazeres e as Sombras que tornaram Torrente Ballester reconhecido em toda a Espanha”.
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||| Por falar nisso é uma série de textos publicados no Baú sobre a temática da publicação presente.
Excelentes exemplos. Alguns deles eu escrevia mal,se o computador me não corrigisse, por exemplo SMS, que eu julgava ser masculino.
Obrigada pela partilha.