É professor em filosofia na Universidade Federal de Ouro Preto, no Brasil, apesar de ser português. É autor de vários livros de filosofia, incluindo manuais para o ensino secundário.
Baú:
O navio onde viajas tem carga a mais. A ti, coube-te lançar à água dois dos 3 livros que levas (um de filosofia, um de música e um romance).
Desidério:
Deito fora o livro de música porque a filosofia é para ler e pensar, o romance para ler e imaginar e a música é para ouvir e não para ler.
B:
Lançados os livros, ficaste com três objetos: o livro, um dvd com o teu filme preferido e um leitor de mp3 com uma coleção dos teus top musicais. Um deles também tem de ir para o fundo do mar.
D:
O DVD será deitado fora porque há muito que deixei praticamente de ver cinema: gosto mais na leitura e na música, precisamente porque são menos imediatas, mais estimulantes e imaginativas, do que o cinema.
B:
No dia dos namorados, recebeste um cheque-prenda para comprar um cd. Escolhe.
D:
A nona sinfonia de Philip Glass, porque ainda não ouvi e tenho curiosidade.
B:
Sabemos que, no dia do teu aniversário, uma das prendas foi a passagem para o formato eletrónico (ebook) de uma obra da tua biblioteca. Segreda-nos qual foi.
D:
The Fabric of Reality, de David Deutsch – o seu último livro, The Beginning of Infinity está já em formato electrónico, mas o anterior não.
B:
Tens de abandonar a profissão de professor. Mas não te apoquentes! Escolhe outra, que em qualquer caso terás carro (à tua escolha), cartão de crédito… e 600 mil euros anuais.
D:
Gosto de ser professor, apesar de haver aspectos, como em tudo, de que não gosto. Mas à parte ser professor, seria investigador — isto é um truque porque como investigador teria também a oportunidade de dar alguns seminários.
B:
A Brigada dos Bons Costumes vai queimar-te a biblioteca toda. Toda, não: permite-te ficar com uma obra apenas.
D:
Ironia das ironias, fico com Sobre a Liberdade, de J. S. Mill, que explica precisamente o que há de errado no que a Brigada está a fazer.
B:
Os deuses estão fulos com a humanidade: vão destruir todas as cidades. Deixarão apenas ficar uma para tu viveres. Diz-lhes qual há de ficar de pé.
D:
Ouro Preto, porque me evita a mudança e porque é uma cidadezinha adorável e com um bom clima para trabalhar e viver.
B:
Estás condenado a escolher, sem hipótese de abstenção, mas apenas um: Sartre, Nietzsche, Heidegger.
D:
Sartre, porque apesar de não saber filosofar bem, como os outros dois, tem a vantagem não negligenciável de ter escrito peças de teatro interessantes.
B:
Para a ilha deserta, só podes levar um destes três B: Bach (Johann Sebastian), Beethoven, Beatles.
D:
Fico-me com Beethoven porque o conheço melhor. Com os Beatles seria uma ilha infernal, se fosse obrigado a ouvir-lhes a música.
B:
Tens pozinhos mágicos que te permitem ressuscitar quem tu quiseres. Duas condições: só os podes usar uma vez; nunca em proveito de qualquer familiar.
D:
George Orwell, se excluirmos não apenas os familiares mas também os amigos mortos. Precisamos do seu pensamento sem peias, expresso no seu ensaísmo, da sua recusa em pensar segundo fórmulas previsíveis e gastas, da sua independência face a receitas ideológicas cegas. Mas também porque sinto uma estranha afinidade com esse homem, com o seu pensamento, as suas palavras o seu estilo literário.
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Nota: esta é a terceira de uma série de revelações que pedi a alguns dos meus amigos. Leia as de Luís Rodrigues (a anterior) e de Elisabete Ferreira (a seguinte).
||| Desidério Murcho escreveu para O Meu Baú um texto sobre Metafísica, onde apresenta bibliografia em língua portuguesa, apropriada para quem tem curiosidade sobre o tema.