Num texto publicado em El País de 14 de março passado, com o título ¿Dónde está la gran filosofía?, Javier Gomá Lanzón defende que a missão da filosofia (desde as suas origens) tem sido propor um ideal: a grande filosofia é ciência do ideal — ideal de conhecimento exato da realidade, de sociedade justa, de beleza, de indivíduo. Para cumprimento dessa missão, acrescenta o autor, o instrumento de trabalho (tal como acontece com a ciência) são os conceitos, ainda que (contrariamente à ciência) tais conceitos não sejam verificados em laboratórios ou experimentações. O que mantém viva uma (grande) filosofia é, por consequência, não o ela ter sido validada empiricamente, mas o facto de “a sua leitura continuar a ser de algum modo significativa”. E é isto que aproxima a filosofia da literatura.
Ora, segundo Javier, nos últimos trinta anos, a filosofia desertou da sua missão de propor um ideal à sociedade do seu tempo. As universidades (alemãs, francesas, italianas, americanas,…) ficaram sem iniciativa — “a vitalidade da filosofia académica francesa ou italiana apagou-se e foi substituída por ensaios de entretenimento”. Ausentes as grandes filosofias, o que encontramos é uma variedade de formas menores, a primeira das quais é uma “filosofia indireta”, praticada nas universidades, que substitui a filosofia por história da filosofia e é representada por personalidades tão distintas entre si como Richard Rorty, Charles Taylor ou Hans Blumenberg. “É filosofia, é até boa filosofia, mas não grande filosofia, porque carece de intenção propositiva, abarcadora e normativa, de uma imagem do mundo completa e unitária”.
O texto, que está longe de ser pacífico, está todo aqui. Sugiro que o leia e nos deixe a sua opinião.
Já tinha lido este texto e percebo a frustração evidenciada na ideia principal. A noção e o sentimento – sublinho, o sentimento – que também tenho é que a filosofia contemporâneal é uma espécie de metadiscurso, uma leitura sedenta de desconstruir, analisar e psicanalisar, esmiuçar, interpretar e exaurir o significado da própria filosofia, e já não do mundo diretamente. Mas uma metafilosofia também pode ser uma forma de nos dirigirmos ao mundo, de forma enviezada. É que o mundo contemporâneo também não é tão diretamente interpretável como há 200 anos, se calhar é preciso “ir lá” com muitos rodeios e cautelas conceptuais, indiretamente. Mas, de facto, é um método muito menos interessante, árido e chato.