João de Araújo Correia, médico e escritor

João de Araújo Correia

Nestes termos se identificou com a cidade do Porto o escritor João de Araújo Correia:

Não nasci no Porto. Mas, tenho-lhe tanto amor como se ali nascesse. Nada do que interessa ao Porto me desinteressa a mim. Se não nasci no Porto, ali me nasceu a minha magra cultura, ali desabrocharam as minhas ideias e ali se firmaram os meus ideais. Sonhos, se alguns tenho sonhado são imagem da sua neblina, que, a certas horas, imponderaliza a cidade.

Tertúlia de João de Araújo Correia promoveu um percurso evocativo da cidade na obra do escritor, a que chamou O senhor Porto e que teve lugar no dia 12 de outubro de 2013. Ao almoço na Ordem dos Médicos, João de Araújo Correia (neto)  evocou a figura do avô:

Fui incumbido da tarefa de vos dizer algumas palavras, como representante da família do homenageado. Aceitei-a de bom grado, porque aprendi bem cedo o valor da família e o quanto devemos agradecer a quem nos quer bem.

Sou neto de João de Araújo Correia e compartilho com ele o amor pela Medicina, tendo entrado na mesma Escola Médica do Porto, agora com o nome de Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, 50 anos depois da sua formatura em 1927.

O meu Avô, que foi sempre avesso a homenagens institucionais ou a palcos demasiado iluminados, teria gostado desta evocação na cidade do Porto, que sempre sentiu como sua. No seu livro Horas Mortas, diz na crónica Férias Curtas: “…Este ano, as minhas férias grandes foram mais curtas do que as saias das meninas, que por aí mostram as coxas. Parei ainda assim, meia dúzia de dias no meu Porto e dei um salto a Vigo… Do Porto pouco direi, porque o tenho mais no coração que na cabeça. Mais o sinto do que o penso — embora se diga que o coração, posto a falar, é mais eloquente do que mil cabeças…

O Porto entra na vida de João de Araújo Correia pela mão da Medicina, quando em 1916 se matricula na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Quando frequentava o 3º ano do Curso de Medicina, é obrigado a interrompe-lo por doença, durante seis longos anos. É neste período de convalescença em Canelas do Douro, que se encontra com a literatura e publica os primeiros versos e crónicas nos jornais da região. Volta ao Porto em 1923, para concluir o Curso de Medicina, já casado e com filhos, só conseguindo fazer face ás despesas, com o recurso a aulas particulares que dava a alunos do ensino secundário. Em 1925, na sua casa alugada de Ramalde, nasce o seu segundo filho, o meu Pai Camilo, que assim chamou como preito de homenagem ao escritor genial Camilo Castelo Branco, por quem teve sempre uma admiração desmedida. Também ele viria a ser Médico e Escritor. Na Universidade do Porto, foi discípulo e depois amigo de Ferreira da Silva, Abel Salazar, Magalhães Lemos, Rocha Pereira, Ricardo Jorge e tantos outros. À Medicina dedicou a maior parte do seu tempo e reconheceu-a como sua grande musa inspiradora: “…Ás vezes, João Semana do Norte vai até ao Porto. E aí se regala, ouvindo falar de casos extraordinários, resolvidos com argúcia, tenacidade e saber, tanto em hospitais como em casas particulares. Cirurgião audacioso, abre uma barriga abandonada e tira de lá, a tempo, um tumor maligno… De amena conversa entre colegas, surge um diagnóstico e uma terapêutica felizes. Podem salvar, daí a horas, doente condenado e já em oratório. O Porto, orgulhoso de todos os seus bens, pode gabar-se da sua classe médica, mais laboriosa, sem ofensa, do que a classe mercantil…” in Horas Mortas – Médicos do Porto.

Em 1927 foi viver para a Régua, onde fixou residência e começou a exercer clínica e em 1936 edita o seu 1º pequeno livro, referido como Escorço – Linguagem Médica Popular Usada no Alto Douro. Mas, o Porto não abandonou o seu pensamento. Podemos comprová-lo nos seus livros e também nas crónicas que manteve durante anos no Jornal O Comércio do Porto. Por tudo o que vos disse, esta iniciativa da Tertúlia João de Araújo Correia de fazer uma evocação do seu patrono no Porto, não esquecendo neste roteiro a Ordem dos Médicos, faz todo o sentido e é motivo de alegria para a nossa família. Não nos esqueçamos que João de Araújo Correia fazia questão de se definir como Médico e Escritor, sempre por essa ordem. 

Bem hajam, pela vossa presença e entusiasmo!

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