Barco negro é um dos fados (com aspas ou sem elas) de Amália de que mais gosto. A história deste “fado” não é muito conhecida. A letra original era outra e foi censurada em Portugal: o título da composição (dos brasileiros Caco Velho e Piratini) era Mãe preta e tinha uma conotação anti-racista; de
[…] enquanto a chibata
batia em seu amor
mãe preta embalava
o filho branco do sinhô
por obrigação da censura, passou a
[…] enquanto na senzala
trabalhava o seu amor
mãe preta embalava
o filho branco do senhor
É a versão censurada que os Duo Ouro Negro utilizam:
Um disco recente dá a conhecer a versão original, na voz de Maria da Conceição, que, nos inícios dos anos 1950, a divulgou com muito êxito:
Alciony Menegaz dá-lhe este balanço:
E Deolinda Bernardo dá-lhe esta força:
A belíssima letra que Amália canta (agora, com o título mudado para Barco Negro) é de David Mourão-Ferreira, composta para o filme Les Amants du Tage (1954), onde Amália é protagonista:
A interpretação de Ney Matogrosso:
O belo poema de David Mourão-Ferreira:
De manhã, que medo, que me achasses feia!
Acordei, tremendo, deitada na areia
Mas logo os teus olhos disseram que não,
E o sol penetrou no meu coração
Mas logo os teus olhos disseram que não,
E o sol penetrou no meu coração.
Vi depois, numa rocha, uma cruz,
E o teu barco negro dançava na luz
Vi teu braço acenando, entre as velas já soltas
Dizem as velhas da praia que não voltas:
São loucas! São loucas…
Eu sei, meu amor,
Que nem chegaste a partir
Pois tudo em meu redor
Me diz que estás sempre comigo.
No vento que lança areia nos vidros;
Na água que canta, no fogo mortiço;
No calor do leito, nos bancos vazios;
Dentro do meu peito, estás sempre comigo.
(…)
Eu sei, meu amor,
…. …. ….
Muito bom!!!