- Recomenda uma sentença (que julgo ter selo de fabrico brasileiro): “se o estupro é inevitável, relaxa e goza!”. Quando recordo essa sentença, terrivelmente sábia (porque eventualmente nos ajuda a suportar e a ultrapassar situações dramáticas), espontaneamente associo-a ao estoicismo.
- A ideia central dos estoicos (“estoico” forma-se a partir de Stoa, o pórtico pintado em Atenas, onde estes filósofos se reuniam e se ensinava a sua doutrina) é esta: há coisas que não podemos controlar e, portanto, não podemos mudar (se chove ou faz sol; se determinada doença é incurável ou não;…); mas há outras que estão sob o nosso controlo e podemos mudar – e é apenas com estas que nos devemos preocupar. A nossa sorte pode ser boa ou má, sem que nós possamos fazer o que quer que seja em sentido contrário; mas a reação, boa ou má, face a ela depende de nós: não temos de sentir tristeza, se estamos doentes ou até se perdemos o ente mais querido (sentimo-la só se quisermos). Em suma, devemos controlar e até, se possível, eliminar todas as emoções, permanecendo indiferentes às contrariedades, à dor, à morte,…
- Um dos sítios com visita recomendável em Mérida (a capital da Estremadura espanhola) é a Área funeraria de los Columbarios, um espaço expositivo que nos aproxima ao conhecimento do mundo funerário romano através de restos arqueológicos aí conservados. À entrada, o visitante é convidado a percorrer um caminho (“que, como a própria vida, conduz ao mundo funerário”) pensando no sentido da vida. Essa reflexão é feita pelo confronto entre o estoicismo e o epicurismo, duas correntes filosóficas de origem grega que contaram com numerosos seguidores da época romana. Ambos os lados do caminho estão inundados de pensamentos das duas correntes, sobretudo de Epicuro e Séneca [segundo o qual a brevidade da vida não deve ser motivo de tristeza – devemos é desfrutá-la ao máximo (ver citação aqui)].
A ideia dos Columbarios está bem apanhada, porque o estoicismo gerou-se na Grécia antiga mas foi no Império romano que floresceu; por outro lado, é difícil dar um pontapé no solo de Mérida sem que dele salte qualquer vestígio da época romana.
- O referido painel inicial esclarece que o epicurismo ensina a desfrutar da vida, a enfrentá-la com alegria, a ser o menos vulnerável possível à dor, enquanto o estoicismo promulga a sabedoria para dominar os sentidos e conseguir a virtude com o controlo das paixões mundanas. E termina o esclarecimento perguntando: Achas-te estoico ou epicurista?
É isto que, atualmente, se considera ser um epicurista: alguém que defende um modo de vida baseado no prazer dos sentidos – as boas comidas, os prazeres sensuais, a luxúria… Se admitirmos esse significado (um dia destes, explicarei que não era exatamente isso que Epicuro, o fundador do epicurismo, pensava), então o epicurismo e o estoicismo defendem atitudes contrárias face à vida. E eu pergunto:
a) o meu leitor acha-se estoico ou epicurista?
b) a sentença com que comecei este texto supõe uma atitude epicurista ou estoica?