NÃO HÁ CIENTISTA, ARTISTA, FILÓSOFO ou poeta que não tenha detido o seu relógio para se sentar a pensar um pouco sobre o tempo.
Assim inicia, no suplemento Babelia de El País de 8 de fevereiro de 2014, um texto de Jorge Wagensberg, professor de Teoria dos Processos Irreversíveis na Universidade de Barcelona e autor de livros como Si la naturaleza es la respuesta, ¿cuál era la pregunta? ou A más cómo, menos por qué.
Recorda depois a famosa frase de Santo Agostinho: Se ninguém me pergunta, eu sei o que é o tempo; mas se quiser explicar a quem indaga, já não sei. E distingue diferentes tipos de tempo:
Existe o tempo imutável dos astros (tanto que se pode prescindir dele), o tempo irreversível da termodinâmica (flui do passado para o futuro, mas não em sentido oposto), o tempo acelerado da fisiologia (pergunte-se aos nossos idosos), o tempo caprichoso da psicologia (rápido para as emoções, lento para o tédio), o tempo da Relatividade especial (conforme a velocidade), o tempo retardado da evolução do Cosmos (assegura-o o Professor Senovilla, em nome da Relatividade Geral: o tempo morre-se-nos), o tempo histórico das bifurcações (em torno das quais reina o acaso)… O primeiro hominídeo que se deu conta de que a primavera, já a tinha visto antes deu um passo de gigante na conceção de tempo. Homo sapiens visa antecipar o futuro em nome da sobrevivência e recuperação no passado , em honra de sua identidade. O que é o tempo? Tentamos pegar conceito tão evasivo com um punhado de aforismos .
Finalmente, procura agarrar o conceito fugidiço de tempo, num punhado de aforismos:
- Não se pode definir o tempo sem a referir à mudança nem definir a mudança sem a referir ao tempo.
- Os minutos são todos iguais para que o tempo não seja responsável direto pelas mudanças que ocorrem na realidade.
- Uma baleia de 200 toneladas vive mais de oitenta anos e um musaranho de dois gramas, apenas dois; mas se não medirmos as suas vidas em anos, nem em dias, mas em número de batimentos do coração, teremos que acabam por viver o mesmo.
- Pode-se viajar ao passado mas deixando, necessariamente, o corpo no presente (folheando um álbum de fotos).
- Pode-se viajar ao futuro mas levando consigo, necessariamente, o corpo como bagagem (viajando a uma velocidade próxima à da luz).
- Na história da humanidade nunca alguém tropeçou num turista vindo do futuro, apesar de que, dado que o futuro é em princípio infinito, a probabilidade deveria ser muito alta se tal coisa não fosse de todo impossível.
- Existe o quilómetro zero das estradas, mas não existe o ano zero no calendário; daí o erro recorrente de celebrar o virar de século e de milénio com um ano de antecedência.
- A harmonia é o ritmo do espaço e o ritmo, a harmonia do tempo.
- Determinista não significa previsível; por exemplo: a teoria do caos é ao mesmo tempo determinista e não previsível.
- O cérebro foi inventado para sair de casa, a memória, para voltar a casa.
- A paleontologia humana tem um passado com muito futuro.
- Não se pode existir se a seguir se não persistir uma mínima fração de tempo, nem se pode persistir se antes não se aceder à existência.
- Se a existência implica persistência e a persistência implica existência, então existir e persistir são no fundo a mesma coisa.
- Existir é persistir: aqui está a indissolúvel relação entre Ser e Tempo que Heidegger não quis exprimir numa única frase.
- Muitos romances, na sua primeira frase, aludem explicitamente ao tempo ou ao espaço.
- Las Meninas de Velázquez talvez seja a primeira pintura da história da arte com a vontade expressa de narrar o fluir do tempo de um volume de três dimensões representado numa superfície de duas dimensões, ou seja: o cinema.
- A passagem do tempo faz com que as horas nos pareçam cada vez mais longas e que os anos nos pareçam cada vez mais curtos.
- Viver envelhece.
- É possível que o saber não ocupe lugar, mas o que é tempo…
- O tempo passa, sempre acaba por passar: é apenas uma questão de tempo.