- O uso intensivo de mensagens curtas através de telemóveis (vulgo, sms) irá (está a) modificar a língua. A língua escrita, num curto prazo, e, inevitavelmente, a língua falada, num prazo não muito mais longo. São imprevisíveis as consequências da quase ausência de acentuação nos sms, do caráter telegráfico das mensagens, das abreviaturas exigidas pelo espaço reduzido…
Abreviaturas comuns no género de pk em vez de porque fazem estragos, se mais não for porque nos desabituam de ver as palavras bem escritas. Mas não são, entendo eu, o mais grave (tenha, aqui, grave o sentido que tiver). Graves são as alterações que passam duradouramente para a língua, escrita ou falada; “tá”, substituto de “está”, talvez seja o exemplo mais comum dessas alterações: o verbo tar passou dos telemóveis para as folhas dos testes escolares e parece ter já uma boa implantação no “mercado” da escrita, sobretudo a mais jovem, e da própria oralidade.
- A pontuação, quando não está completamente ausente, ocupa poucos dos carateres limitados dos sms. Pouco usada naquele que é um dos meios de escrita mais utilizados pelos jovens, a pontuação perde importância em outras situações de escrita mais formal.
Não será essa a razão única explicativa das deficiências de pontuação que, cada vez mais, correm pelos textos; aliás, os seus autores têm, em muitos casos, mais idade que os telemóveis. Pontuar um texto requer um tal conhecimento da (e uma sensibilidade para a) língua – mesmo quando esse conhecimento e essa sensibilidade já se tornaram reflexos – que só pode gerar uma certa condescendência, em relação a essas deficiências. Até porque pontuar é um ato com uma componente de subjetividade muito forte – e vou deixar entre parêntesis a “péssima” pontuação dos livros de Saramago…
- É nas redes sociais (com características de escrita próximas das dos sms) onde é mais visível quanto a pontuação sofre. No Facebook, por exemplo.
Particularmente quando o número de “amigos” do Facebook atinge várias centenas, não é fácil passar um dia sem aniversários. As mensagens de felicitações ao (e de agradecimento do) aniversariante são a amostra de que o vocativo está a perder a vírgula que lhe foi atribuída, sabe-se lá há quanto tempo. Em tendencialmente 100% das celebrações, escreve-se “Parabéns Luís”, em vez de “Parabéns, Luís” e “Obrigado Maria”, em lugar de “Obrigado, Maria”. E parece ser assim o correto, incluindo a competentes professores de Língua Portuguesa.
- Os próprios responsáveis pelos chamados meios de comunicação parecem desconhecer a importância de separar devidamente (quero dizer, através de vírgula) o vocativo, dos outros termos sintáticos: para dar um só exemplo, além do que figura no “Adeus checos” da imagem – a RTP todos os dias nos informa através de um “Bom dia Portugal” – um programa, também ele, sem vírgula.
Um dia destes, uma cena de documentário, num canal televisivo, mostrava um diálogo entre dois jovens que comiam pêssegos. Às tantas, um deles insistiu com o outro, que não queria comer mais; segundo a legenda, ter-lhe-ia dito: “Come mais um rapaz!”. A diferença entre este incentivo e o que, presumivelmente, terá sido dito em inglês (algo no género de “Come mais um, rapaz!”) é muito grande. Ainda que a única diferença visível seja apenas uma minúscula vírgula, a do vocativo.
Este texto pertence à série Pensar o quotidiano. Os textos da série estão todos aqui.
Farei apenas alguns comentários. Espero que ajude ou que gere algumas discussões, o que seria ainda mais interessante.
Primeiro, a pontuação é um aspecto totalmente objetivo, pois depende da sintaxe da língua e não do gosto do autor/escritor. Segundo, a notícia acima usa um recurso muito comum da escrita na atualidade, o recurso da MULTIMODALIDADE (diferentes modos de utilizar a escrita, como negrito, itálico e muitos outros), que no caso acima é a marcação do vocativo pelo uso das diferentes cores, substituindo a vírgula.
Terceiro, de forma alguma o msn está influenciando a língua oral. A palavra “tá” ou “ta” em orações do tipo “vc ta bem?”,utilizadas frequentemente no msn, já eram usadas na modalidade oral de nossa língua muito antes de este recurso aparecer nas redes sociais. Nesse caso, é a oralidade que influencia a escrita em chat’s. Afinal, ninguém anda por aí falando “vc tá bem?”. Aliás, nesses espaços virtuais a conversação é muito dinâmica e rápida, tendendo a aproximar-se da oralidade. Por isso as abreviações são de extrema importância, pois é o gênero textual que exige a utilização desse recurso.
Concordo que as pessoas estão escrevendo FORMALMENTE muito mal, mas isso é por falta de prática da escrita ou porque os professores, ao invés de explicar a seu aluno que cada gênero textual e cada situação de comunicação exige uma forma de escrita equivalente, preferem
criticar o que ele escreve.
Boa tarde, Elias Coelho.
Sobre o que você pontuou em:
“Segundo, a notícia acima usa um recurso muito comum da escrita na atualidade, o recurso da MULTIMODALIDADE (diferentes modos de utilizar a escrita, como negrito, itálico e muitos outros), que no caso acima é a marcação do vocativo pelo uso das diferentes cores, substituindo a vírgula.”
O uso da vírgula pode ser: OBRIGATÓRIO ou FACULTATIVO. No caso do vocativo, é OBRIGATÓRIO. Não existe vocativo sem vírgula! Os erros e transgressões gramaticais mais comuns estão presentes na propaganda e na imprensa! E é ridículo isso! A vírgula, neste caso, não pode ser substituída por recursos como NEGRITO, ITÁLICO ou CORES.
Pense bem, meu caro!
De acordo, Diego!