10 motivos para ler cinema (1/4)

Ler cinema [nota prévia]

o meu amigo A. Valdemar Oliveira escreveu, a meu pedido, um texto sobre cinema e literatura e ética. Nele, rodam 10 filmes ilustrativos desta relação:

  1. O Desconhecido do Norte Expresso 1950/1951 (Patricia Highsmith/Alfred Hitchcock)
  2. O Coração das Trevas 1899/Apocalypse Now 1979 (Joseph Conrad/Francis Ford Coppola)
  3. A Lista de Schindler 1982/1993 (Thomas Keneally/Steven Spielberg)
  4. A Culpa é das Estrelas 2012/2014 (John Green/Josh Boone)
  5. A Rapariga Que Roubava Livros 2005/2014 (Markus Zusak/Brian Percival)
  6. O Rapaz do Pijama às Riscas 2006/2008 (John Boyne/Mark Herman)
  7. A Teoria de Tudo (ou Viagem ao Infinito) 2014 / 2002 (Jane Hawking/James Marsh)
  8. Do androids dream with electric sheep? 1968/Blade Runner 1982 (Philip K. Dick/Ridley Scott)
  9. Singularidades de uma rapariga loira 1874/2009 (Eça de Queiroz/Manoel de Oliveira)
  10. Nunca Me Deixes 2005/2010 (Kazuo Ishiguro/Mark Romanek)

Dada a extensão do texto, este será publicado em várias partes. Na presente, o autor problematiza a relação entre a obra literária e o filme, antes de analisar O Desconhecido do Norte Expresso. A segunda está aqui.

É discussão antiga, se os filmes conseguem levar à tela toda a dinâmica e toda a profundidade das obras literárias. O que os autores deixam à imaginação do leitor – por muito pormenorizada que seja a descrição – o realizador vê-se obrigado a colocar perante os nossos olhos, tal e qual como ele próprio o vislumbrou.  De certa forma, é como se o espectador se sentisse defraudado na sua imaginação, como se um usurpador da mente lhe roubasse os sonhos, colocando-os de forma definitiva à sua frente, ainda por cima manipulando-os de tal maneira, que lhes altera o conteúdo. O que o realizador nos põe na tela, nunca pode corresponder exatamente aquilo que o nosso cérebro projetou durante a leitura. Também pode acontecer o contrário: depois de um bom filme, o livro pode parecer pouco mais que um panfleto de propaganda. Aconteceu comigo em “A Vida de Pi”, apenas como exemplo, e a obra de Yann Martel não tem culpa disso. Só que o esplendor visual do filme de Ang Lee aniquilou qualquer possibilidade de a leitura voar nas asas da imaginação.

Ler cinema em…

Cinema e literatura: "O desconhecido do Norte Expresso"

O Desconhecido do Norte Expresso 1950/1951 (Patricia Highsmith/Alfred Hitchcock)

Cinema e literatura: "O desconhecido do Norte Expresso"Por alguma razão Hitchcock pediu ajuda a Raymond Chandler (outro autor de literatura negra e policial) para adaptar ao cinema esta história de dois desconhecidos que se cruzam no comboio e planeiam o crime perfeito. Assim se juntaram a rainha e o mestre do suspense. Como é habitual em Highsmith e em Hitchcock, nada é o que parece e tudo pode mudar ao virar da página. Ao contrário do que os leitores e os espectadores de histórias policiais e de mistério estão habituados, pode não haver crime, muito menos sangue e cadáveres. O que está em causa é muito mais próximo do “dever” em Kant, que da “culpa” em Aghata Christie. Se há culpados – e não estou a dizer que haja ou que não haja –, são eles que têm de dormir com a sua própria consciência; o espectador, esse, pode ir-se embora descansado… Ou não?…

Cinema e literatura: "O desconhecido do Norte Expresso"

 

***

A. Valdemar Oliveira, sobre Cinema e literaturaA. Valdemar Oliveira

…nasceu em 1960, o ano de formação dos The Beatles. Uma década de contradições marcantes para a segunda metade do século XX: o amor dos hippies e o assassinato de Kennedy e Luther King Jr.; da primeira ida à Lua e da guerra colonial; do Maio de ’68 e do Woodstock… A década que fecharia com a tão desejada e, ao mesmo tempo, tão chorada morte do ditador Salazar.

Desde pequeno que sempre se achou destinado a ser professor, mas o destino, essa puta que “sabe quanto vale um beijo”, decidiu que havia de ser contabilista, profissão que abraçou com profissionalismo mas sem entusiasmo.

Aos 38 anos achou que estava farto e foi estudar Filosofia para a Universidade Nova de Lisboa, curso onde chegou ao fim, mas que não acabou. Ganhou, no entanto, bagagem para um projeto especialmente dedicado à “Filosofia para crianças” que tem sido um sucesso muito aceitável.

Divorciado, tem uma filha, hoje (novembro/2017) com 17 anos, a quem explica tanto Filosofia como hard-rock e com quem discute Platão ou Heidegger e Justin Bieber ou Slow J. Gosta de Beethoven e Tool, mas ainda está para descobrir se gosta mais das tertúlias ou da boa comida que vem junto com elas e pode matar por um doce conventual alentejano. Perde-se de amores por gin-tónico, tinto e aguardente velha.

Profissionalmente, foi tudo juntamente com contabilista: escriturário na Cinemateca Portuguesa, jornalista num jornal conotado com a direita, operador de caixa numa bomba de gasolina, empregado de balcão numa loja de dietética e tradutor ocasional de panfletos publicitários sobre ervas e raízes, bibliotecário numa “sociedade filarmónica” ou conferidor de receitas numa farmácia.

***

||| Esta é a quinta publicação de uma série pensada para quem decida entrar em determinadas áreas: da filosofia, da música, da história, do cinema… A quarta, sobre Aconselhamento Filosófico e Felicidade, é de Jorge Humberto Dias. A sexta, Free improv jazz: discos marcantes, é de Nuno Martins.

||| Na página de índice deste sítio, encontrará outros textos sobre Filosofia e cinema.

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Scroll to Top