SOFISTA/SOFÍSTICA

Historicamente (na História da Filosofia), a Sofística

[inglês: Sophistics; francês: Sophistique; alemão: Sophistik; italiano: Sofistica]

é um movimento intelectual dos séculos V e IV a. C., desenvolvido em Atenas pelos sofistas.

A palavra sofista não tinha o significado pejorativo que tem hoje. Os sofistas (=mestres da sabedoria) preocupavam-se essencialmente com a educação dos cidadãos, já que não havia um ensino público: eram professores itinerantes que, fazendo-se pagar por isso, ensinavam aos alunos filosofia e retórica — a arte de bem falar e convencer, pela subtileza do raciocínio. Correspondiam assim ao triunfo da chamada democracia (que não incluía os escravos e as mulheres), em Atenas e noutras cidades: preparavam os jovens para a vida prática, designadamente, para a política e os tribunais.

Os fundamentos da sofística podem ser assim resumidos:

  1. (No objeto de estudo da filosofia) recusando que o objeto da filosofia fosse a compreensão do cosmos, o ser humano e os seus problemas foram colocados no centro da reflexão filosófica;
  2. (Na teoria do conhecimento e na filosofia moral) a verdade é redutível ao ponto de vista; o conhecimento reduz-se à opinião e o bem, à utilidade. Consequentemente, defende-se a relatividade da verdade e dos valores morais, que, sendo o resultado de convenções sociais, mudam conforme o lugar e o tempo. Um dos mais ilustres representantes dos sofistas, Protágoras, afirma que o homem é a medida de todas as coisas.
  3. (Na Retórica) Erística: habilidade em refutar e sustentar ao mesmo tempo teses contraditórias. A arte de um professor de retórica é a de poder defender com convicção qualquer tese e, sobretudo, poder “tornar forte a causa fraca”.
  4. (No pensamento do direito) oposição entre natureza e lei; na natureza, prevalece o direito do mais forte.

Nem todos os sofistas defendem essas teses: os grandes sofistas da época de Sócrates (Protágoras e Górgias) sustentaram principalmente as duas primeiras. As outras foram apanágio da segunda geração de sofistas.

[cfr entrada Sofística in ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1998]

"Apologia do Sofista" de Savater

||| Como ficou dito, a figura mais ilustre da sofística foi Protágoras. Outro sofista importante, Górgias (c. 485-380 a. C.) levou ao extremo a dúvida sofística; segundo ele,
. nada existe;
. mesmo que alguma coisa existisse, não poderia ser conhecida;
. mesmo que pudesse ser conhecida, não poderia ser comunicada a outrem.

||| A tradição filosófica retém dos sofistas sobretudo a imagem, frequentemente caricatural, que deles dá Platão, o qual os considera uns charlatães, inimigos da verdade e disseminadores de ilusões. Para dar um exemplo, numa das passagens (ligeiras…) do seu livro Eutidemo, dois sofistas, Dionisodoro e Eutidemo, desconcertam um tal Clesipo com este raciocínio:

— Diz-me, pois: tens um cão?
— E um bem mau, disse Clesipo.
— E ele tem cachorrinhos?
— Sim, e todos 
como ele.
— Então o pai deles é esse cão, 
não é?
— Em verdade, eu, em pessoa, vi-o cobrindo a cadela.
— E 
então? O cão não é teu?
— Perfeitamente, disse ele.
— Então, ele é pai e 
é teu; portanto, é o teu pai e os cachorrinhos são teus irmãos.

||| Genericamente,  sofista é aquele que procura menos a verdade que o poder, o sucesso ou o dinheiro.

||| Há quem tenha procurado reabilitar os sofistas. No seu Dicionário de Filosofia (Lisboa: Gradiva), Simon Blackburn faz notar que “a atitude geral dos sofistas não parece ter sido muito diferente da de Sócrates, mantendo aqueles e este uma posição razoavelmente cética em relação às cosmologias especulativas, tais como as dos Eleatas, e uma insistência também razoável no estudo dos fundamentos da moral e da epistemologia”.

||| Num ensaio com o título Apologia do sofista (uma espécie de paródia a sério do conhecido texto Apologia de Sócrates, de Platão), Fernando Savater aborda alguns temas relacionados com os sofistas: o niilismo, a retórica, o imoralismo, o ateísmo… O polémico/irónico texto, lido numa conferência do filósofo espanhol a que se seguiu um colóquio bastante agitado, foi entretanto publicado, com um epílogo onde o autor recolhe alguns aspetos do referido tumultuoso colóquio e outros escritos sobre temas muito diversos (Apología del sofista y otros sofismas. Madrid: Taurus, 2ª ed., 1997).

 

 

 

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